Como os CEOs definem a vulnerabilidade — e se beneficiam dela

"O tipo tradicional de líder — aquele que diz a todos o que fazer e usa cenouras e porretes para alinhar o comportamento das pessoas — não é mais válido. As pessoas não querem seguir esse tipo de líder.”

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Por quase uma década, CEOs vêm sendo informados que a vulnerabilidade os tornaria líderes mais eficazes, construindo maior confiança e impulsionando o engajamento dos funcionários.

Porém, alguns executivos tradicionais, fortes e oniscientes, ainda sentem certo desconforto em baixar a guarda àqueles que não são seus confidentes, preocupando-se com possíveis críticas. Você é um deles?

Para profissionais que ascenderam ao topo da escada corporativa, medo e ceticismo são compreensíveis, mas a crescente complexidade do cenário empresarial atual argumenta a favor de lideranças mais voltadas para o ser humano.

"O tipo tradicional de líder — aquele que diz a todos o que fazer e usa cenouras e porretes para alinhar o comportamento das pessoas — não é mais válido”, disse Hubert Joly, ex-presidente e CEO da Best Buy. “As pessoas não querem seguir esse tipo de líder.”

Abordagens fechadas e inflexíveis também podem apresentar sérias consequências comerciais. Empresas lideradas por CEOs aparentemente “invencíveis”, muitas vezes, apresentam dificuldades na resolução de problemas e na promoção de uma cultura de inovação — visto que o fracasso é uma parte do processo de aprendizagem.

“Quando as pessoas temem falar, pode haver centenas de ideias que nunca serão ouvidas”, disse Joe Davis, sócio sênior do BCG. “Quando você compartilha mais de si mesmo, suas oportunidades, desafios, incertezas e até mesmo inseguranças, isso oferece liberdade para que outros façam o mesmo.”

O engajamento é outro fator diretamente afetado pela falta de conexão entre líderes e seus funcionários, um problema atual e crescente. Uma recente pesquisa da Gallup revelou que apenas 30% dos funcionários dos EUA se sentem altamente envolvidos e entusiasmados com seu trabalho, a menor parcela em mais de uma década. Globalmente, 62% dos funcionários não estão engajados ou estão produzindo o mínimo, enquanto 15% estão ativamente desengajados ou buscando uma movimentação profissional.

Desbloquear o valor de uma liderança vulnerável começa com a compreensão do seu verdadeiro significado e potenciais benefícios. A partir daí, CEOs enfrentam o desafio de superar os medos comuns associados ao compartilhamento de suas próprias vitórias, desafios e incertezas, construindo estratégias para fazer isso de forma saudável e sustentável para todos.

O que a vulnerabilidade representa para os CEOs?

A vulnerabilidade envolve necessariamente um risco, ou um risco percebido, que pode afetar a reputação, a carreira, os relacionamentos, a confiança conquistada e a organização. Para alguns CEOs, ser vulnerável é, principalmente, ter a coragem — ou mentalidade estratégica — de se permitir não saber de tudo, o tempo todo. “Vulnerabilidade significa estar absolutamente confortável e confiante para dizer ‘não sei’ e pedir ajuda àqueles que podem.” — David Sloman, ex-chefe do Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido.

Como notável caso, temos Kristin Peck, que assumiu o cargo de CEO na gigante Zoetis, do segmento de saúde animal, em janeiro de 2020. “Meu antecessor [Juan Ramón Alaix] foi, para mim, o modelo de como um CEO deve ser: sempre preparado , calmo e infalível. Sempre tendo a resposta”, disse. Após dois meses no cargo, a pandemia de COVID-19 abalou a organização. “Estávamos todos descobrindo como navegar em uma realidade pandêmica. Começamos a nos conectar mais com o coração, reconhecendo que nem sempre teremos todas as respostas para as dificuldades, e que isso não é um problema”.

Experiências legítimas como essa ajudam a esclarecer o que a vulnerabilidade não é — ou seja, uma ferramenta performativa que líderes implementam na tentativa de parecerem mais agradáveis ou identificáveis.

Especialistas aconselham líderes a pensar na vulnerabilidade pelo que ela realmente é: uma parte inevitável do ser humano e uma base para uma liderança autêntica. “Vulnerabilidade não é uma escolha”, diz Amy Edmondson, Professora de Liderança e Gestão da Novartis na Harvard Business School. "É um fato."

Benefícios para a organização

Embora a responsabilidade geralmente recaia sobre o CEO, especialistas descrevem a liderança atual de um negócio como um empreendimento colaborativo, que exige humildade, coragem, conexão e abertura para ideias e críticas. A vulnerabilidade abrange todas essas qualidades, ajudando o líder a criar um ambiente onde os desafios são enfrentados de frente e as discussões francas com o conselho são vistas como um sinal de força.

“Você perde a confiança se dá a impressão de que tem tudo sob controle”, reforçou Hubert Joly, acrescentando que isso também pode sinalizar que um CEO não percebe problemas onde outros claramente veem. Parecer infalível transmite aos funcionários que a falha é inaceitável — prejudicando a formação de mindsets ousados e inovadores que mantêm organizações competitivas frente à volatilidade do mercado.

“A transformação requer que a criatividade coletiva da organização seja liberada”, disse Jim Hemerling, diretor administrativo da BCG. “Você precisa que as pessoas inovem. Você precisa que elas sejam criativas. Isso requer algum nível de confiança e a disposição de ser vulnerável, de dizer 'eu não tenho todas as respostas.'”

Especialmente entre os profissionais mais jovens — última leva de millennials e Geração Z —, é popular a demanda por CEOs mais autênticos e empáticos. Uma pesquisa da BCG mostra que colaboradores plenamente satisfeitos com seus gerentes tem 72% menos probabilidade de deixar a empresa quando comparados aos muito insatisfeitos. “Mais jovens estão buscando líderes mais abertos”, comentou Hemerling.

Apesar de comprovados os aspectos positivos promovidos pela vulnerabilidade dos CEOs, dados da BCG indicam que essa característica permanece rara. De 14 mil gerentes analisados globalmente, apenas 16% afirmaram presenciar ocasiões onde suas lideranças solicitaram ajuda, admitiram erros ou reconheceram desafios.

“A mudança está ocorrendo”, confirmou Hemerling, “mas há um amplo espectro em sua prática, disposição e crença de seus benefícios”.

Superando o medo

A vulnerabilidade traz consigo uma série de medos — e entre eles, um dos mais óbvios para qualquer liderança é o receio de parecer fraco. “Todos olham para você buscando o ‘nós vamos conseguir’”, comentou Jennifer Thomas, sócia da BCG e diretora de coaching executivo da empresa. “Então, os líderes temem que a vulnerabilidade abale a confiança dos outros neles e na organização”.

Apesar da dúvida, o ato pode sinalizar o oposto. “Ser aberto sobre suas fraquezas é um sinal definitivo de força”, concluiu Amy Edmondson.

Outro obstáculo comum a ser superado é o medo de estar errado. “A maioria dos CEOs sente o peso do papel que desempenham, das decisões que devem tomar e das pessoas que dependem deles. Funcionários, acionistas, clientes e a sociedade em geral” disse Hemerling. Para o diretor, a vulnerabilidade é a porta de entrada para a superação desse medo. “Estar disposto a dizer 'Não sei a resposta' é uma maneira de combater o medo de estar errado”, concluiu.

Os CEOs, como todos os profissionais, também estão sujeitos à insegurança de parecerem incompetentes e indignos de suas posições. “Em certos momentos, todo mundo tem a síndrome do impostor”, afirmou Thomas.

David Sloman, ex-chefe do Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido, declarou que se preocupava em parecer indigno devido à sua criação e educação modestas, que contrastavam com as de seus colegas. Lembrar dos desafios superados para alcançar sua posição o ajudou a superar essa barreira, tranquilizando-o quanto ao direito de ser ele mesmo no trabalho. “Se você passar a vida tentando ser algo que não é, isso o deixará mentalmente doente”, diz Sloman. “As pessoas percebem isso imediatamente.”

Por fim, o medo de confiar nos outros é um dos maiores empecilhos contra a adoção de uma liderança vulnerável. “Se as pessoas já o decepcionaram, isso pode atrapalhar sua confiança nelas. Mas se você tem medo de ser decepcionado, terá sua autonomia dificultada”, disse Hemerling.

Recorrer a outros em busca de ajuda é um exercício importante para superar esse obstáculo. “Você está deixando que eles façam um investimento pessoal. E conforme você começa a confiar nos outros, e essas pessoas se manifestam por você, isso cria um ciclo virtuoso de construção de confiança nos outros”, concluiu o diretor.

Cinco estratégias para uma vulnerabilidade saudável

Uma abordagem orientada a valores promove conexões positivas entre líder e equipe, resultando em melhores resultados. Porém, é importante encontrar o ponto de equilíbrio para evitar o agravamento do nível de trabalho emocional demandado do CEO, ou prevenir demonstrações de vulnerabilidade inoportunas que possam resultar em danos à reputação.

Para auxiliar na mitigação de desfechos indesejados, especialistas em liderança oferecem uma série de estratégias para auxiliar CEOS na adoção saudável da liderança vulnerável.

  1. Comece pequeno. — Trocar histórias pessoais é uma das maneiras mais poderosas de quebrar o gelo. Líderes são aconselhados a começar de forma conservadora, compartilhando um pouco sobre si mesmos e suas vidas para testar como os outros respondem, sem grandes revelações ou emoções.
  2. Compartilhe experiências edificantes. — Independentemente de ser uma jornada de desenvolvimento pessoal ou uma falha significativa, líderes que abordam tropeços e aprendizados moldam equipes mais adaptáveis e preparadas para o mercado volátil. Essa abertura também pode conectar o CEO à sua equipe de liderança sênior, facilitando um ambiente de trocas.
  3. Considere o tempo e o lugar. — Quando se trata de vulnerabilidade, o contexto importa. A vulnerabilidade que um CEO demonstra ao seu conselho de diretores será diferente da que ele compartilha com subordinados diretos. É necessário vigiar se não é problemático para a proposta de valor da empresa.
  4. Estabeleça barreiras e tenha autoconsciência. — Os riscos são uma parte inevitável da vulnerabilidade. Portanto, é crucial evitar o compartilhamento de informações, sejam pessoais ou comerciais, com indivíduos mal intencionados. Ter consciência sobre o próprio estado de espírito também é importante: para um líder, manter-se calmo é sempre a melhor opção. Uma pessoa estressada, estressa os outros.
  5. Confesse seus erros e mantenha a perspectiva. — A honestidade promove a confiança. Ao não admitir o erro, o líder pode não ter apenas o julgamento questionado, mas também sua autoconsciência. Além disso, é importante manter uma perspectiva equilibrada, pois mesmo as barreiras mais sólidas não podem garantir totalmente que um momento de vulnerabilidade trará os resultados pretendidos. Caso as coisas não saiam como planejado, um senso de propósito e relacionamentos saudáveis são grandes fatores de proteção para ajudar CEOs a transformarem o momento em uma experiência de desenvolvimento.

Muitos CEOs podem achar a vulnerabilidade antitética à sua noção de líder forte e autoconfiante. Outros podem questionar sua validade e poder de permanência, ou podem vê-la como um negócio arriscado em uma era em que os chefes corporativos estão cada vez mais sob pressão para opinar sobre questões políticas e sociais polêmicas .

Tais reservas são compreensíveis, dados os medos que cercam a vulnerabilidade. Mas, à medida que os CEOs enfrentam um ambiente de negócios cada vez mais complexo e desafiador, a vulnerabilidade pode ajudá-los, suas equipes e suas organizações a aprender e progredir mais rápido — e, finalmente, a florescer.

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