Os pontos cegos que acompanham o ciclo de vida de um CEO

Artigo analítico que explora como a jornada de um CEO se desenrola em quatro “estações” e por que cada fase traz pontos cegos específicos. A partir de estudo da McKinsey, o texto examina riscos de complacência, excesso de confiança, perda de clareza estratégica e desafios de sucessão, destacando padrões das lideranças que performam acima da média.

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A trajetória de um CEO raramente é linear. Mesmo executivos experientes enfrentam momentos de clareza e períodos de ilusão, fases de avanço e fases de estagnação, etapas de controle e etapas de vulnerabilidade. Assim como as estações do ano, a liderança no topo se transforma a cada ciclo, e cada fase traz desafios próprios que nem sempre são percebidos, especialmente pelos líderes que acumulam resultados positivos.

A partir deste ponto, o texto se aprofunda na análise desenvolvida em artigo publicado pela McKinsey, assinado por Carolyn Dewar, Vikram Malhotra e Scott Keller, autores de pesquisas amplas sobre o desempenho de CEOs em diferentes contextos e co autores de obras de referência sobre liderança executiva. O estudo reforça que a jornada de um CEO é marcada por quatro “estações” e que, em cada uma delas, surgem pontos cegos que podem comprometer decisões, ritmo de execução, sucessão e criação de valor.

As quatro estações da liderança no topo

A abordagem compara a carreira de um CEO às estações do ano, cada uma com oportunidades, riscos e armadilhas comportamentais específicas.

Na primavera, quando o executivo ainda está em preparação para assumir o cargo, o foco está em ganhar musculatura técnica e reputacional. É o período em que o futuro CEO precisa adquirir experiência relevante, demonstrar consistência e se tornar uma escolha natural para o conselho.

No verão, marcado pelos dois primeiros anos de mandato, o novo CEO entra em modo de definição. É o momento de imprimir visão, acelerar entregas e estabelecer o padrão de execução que marcará a gestão. É também quando surgem os primeiros excessos de confiança e desafios de eficácia pessoal.

No outono, o CEO já consolidou os movimentos iniciais e enfrenta o risco da complacência organizacional. É a etapa que exige reinvenção, disciplina e capacidade de renovar a estratégia, criando novas “curvas em S” para manter a empresa evoluindo.

No inverno, o foco passa a ser a transição. O CEO precisa equilibrar legado, clareza estratégica e o momento adequado de passagem de bastão, enquanto evita decisões defensivas, arriscadas ou desalinhadas com a visão de longo prazo.

Aprendizados dos CEOs que performam acima da média

A pesquisa revela que os melhores CEOs não se destacam apenas por um bom começo ou um bom encerramento. Eles mantêm desempenho superior em todas as estações. Entre os 200 líderes analisados, identificou-se um impacto acumulado de US$ 5 trilhões em valor excedente para acionistas, resultado de ciclos de decisão mais consistentes, capacidade de aprender rapidamente e habilidade de evitar quedas prolongadas de performance.

Mais do que evitar erros, esses líderes demonstram resiliência, ajustam rotas, identificam riscos cedo e mantêm coerência entre direção estratégica, desenho organizacional e ritmo de execução.

Os pontos cegos que comprometem cada fase da jornada

O estudo também investigou onde, exatamente, os CEOs mais tropeçam. A comparação entre autopercepção e percepções de conselhos e equipes diretas mostrou padrões de distorção conhecidos como “efeito Lake Wobegon”, a tendência humana de superestimar a própria performance.

No verão, surgem dois pontos cegos críticos: a subestimação da complexidade cultural e a sobrecarga pessoal. Novos CEOs acreditam que podem transformar comportamento rapidamente e que conseguem absorver todas as demandas do cargo sem reajustes. Na prática, o desgaste aparece cedo e afeta decisões estruturais.

No outono, o ponto cego dominante é a perda de nitidez estratégica. Após resultados iniciais, alguns executivos deixam de sustentar a mesma ambição e, sem perceber, passam a operar em modo incremental. A resistência interna a abandonar estratégias antigas também cresce.

No inverno, o risco está em proteger legados em vez de preparar sucessores. Alguns CEO se tornam excessivamente cautelosos, outros assumem riscos desproporcionais, e muitos permitem disputas internas que prejudicam cultura e continuidade.

O caminho dos líderes que evoluem em todas as estações

As entrevistas realizadas com mais de 80 CEOs de alta performance revelam padrões claros de evolução.

Os melhores líderes:

  • mantêm disciplina pessoal para revisar crenças e hábitos
  • se cercam de feedback qualificado e não filtrado
  • tratam a sucessão como parte da governança, não como um evento isolado
  • equilibram visão de longo prazo com decisões práticas de curto prazo
  • reconhecem limites individuais e ampliam a capacidade por meio de equipes fortes

A pergunta final proposta pelos autores é provocativa: em um ambiente de volatilidade crescente, as quatro estações continuarão sendo referência para interpretar a jornada de um CEO ou novas dinâmicas emergirão? Independentemente da resposta, os pontos cegos continuarão existindo e a liderança excepcional continuará sendo definida pela capacidade de enxergá-los antes que se tornem barreiras estruturais.